domingo, 16 de agosto de 2009

Quem pergunta quer resposta

Nas respostas aos jornal, deve prevalecer não o formalismo legal mas dar aos leitores esclarecimentos tão cabais quanto possível

O TGV é uma das principais polémicas que hoje agitam o país, e sempre foi apanágio do PÚBLICO dar o máximo de contributos aos debates cruciais

“Lista de perguntas a que era bom dar resposta” - assim se intitulava o editorial de José Manuel Fernandes saído no PÚBLICO de 17 de Junho, elencando uma série de questões a que “era bom que, ao menos, [o ministro das Obras Públicas] Mário Lino e a sua equipa pudessem responder (...) para esclarecer algumas das muitas dúvidas que o projecto do TGV levanta”. As perguntas básicas eram seis, mas, à maneira das bonecas russsas, casa uma encerrava outras, pelo que no total o director do PÚBLICO endereçava às autoridades governamentais 22 questões sobre os planos relativos ao comboio de alta velocidade.

No final, José Manuel Fernandes rematava: “Poder-se-ia continuar indefinidamente, multiplicando as questões a que não responde a muita papelada distribuída pela RAVE [Rede Ferroviária de Alta Velocidade, S.A., a empresa de capitais públicos à qual compete a implantação do TGV] e pelo ministério. Sendo assim, quem assina por baixo?”

Pelo menos uma pessoa resolveu assinar por baixo, o administrador da RAVE Carlos Fernandes, que dois dias depois remetia a José Manuel Fernandes uma carta onde respondia às 22 perguntas suscitadas. O jornal não tomou a iniciativa de publicar a carta, alegando que era demasiado longa (12.500 mil caracteres – sendo que a crónica desta página tem um tamanho médio de 10 mil caracteres), pelo que explicou José Manuel Fernandes ao provedor: “[Uma secretária da direcção do PÚBLICO] entrou em contacto com uma secretária da administração da RAVE, que a passou a alguém que não sabe identificar pela função, mas que presumo ser do departamento de comunicação. Colocou oralmente o problema de um artigo com aquela dimensão, para além de chegar em papel e não por mail, o que coloca problemas de composição (não temos ninguém para essas funções), ser impossível de paginar no P1. Indicou-lhe a dimensão ideal do texto e ele ficou de dizer qualquer coisa”.

O provedor não conseguiu apurar se o PÚBLICO recusou taxativamente a publicação da resposta. A regra que José Manuel Fernandes enunciou é o seguinte: “Habitualmente o que fazemos é sugerir que se reduza para o tamanho de um texto de opinião (que, com raras excepções, não deveriam ultrapassar os 5 mil caracteres)”.

“Recusa” ou “sugestão”, a verdade é que a empresa aceitou a atitude do jornal como imposição inapelável, e formulou nova carta, dentro do espaço exigido/sugerido, esclarecendo incluir apenas “as respostas aos três primeiros grupos de perguntas, sendo informados os leitores do PÚBLICO de que o conteúdo integral do esclarecimento às questões colocadas pelos jornal pode ser lido no site da RAVE: www.rave.pt”. Na carta, a RAVE historiava também o atribulado processo de resposta ao editorial de José Manuel Fernandes: “O senhor director do PÚBLICO entendeu que, para ser publicada, essa resposta não deveria exceder 5 mil caracteres. Obviamente, se o que se pretende é, acima de tudo, contribuir para um bom esclarecimento público, não é possível responder de forma minimamente completa e clara a 22 perguntas sobre temas complexos nesse espaço (...). Pelos vistos, não é esse o entendimento [de José Manuel Fernandes], vendo-se assim a RAVE limitada no seu legítimo direito de resposta às perguntas colocadas no referido editorial”.

A nova resposta foi publicada na secção “Cartas do Director” de 4 de Julho, mas com uma nota onde José Manuel Fernandes dizia: “Sugere-se nesta carta que o PÚBLICO teria limitado à RAVE o direito de esclarecer os nossos leitores. O PÚBLICO limitou-se a dizer que as dimensões da carta não permitiam que esta fosse publicada, na íntegra, na edição em papel, e deu como referência o tamanho do texto a que ela respondia, fazendo-o nos termos da lei. A RAVE preferiu ocupar quase um terço desse espaço a atacar a decisão do PÚBLICO em vez de responder a mais uma das 22 questões.”

A empresa entendeu então queixar-se ao provedor, em carta assinada pelo mesmo administrador, onde se concluía: “Pelas razões expostas, a RAVE reafirma que se considera limitada no seu legítimo direito de resposta às perguntas colocadas no editorial de 17 de Junho”.

A questão não escapou também ao leitor João Garcia, que reclamou junto do provedor: “Não posso deixar passar o que considero mais uma machadada no direito à informação dos leitores do PÚBLICO. (...) Afinal José Manuel Fernandes queria respostas às suas perguntas ou apenas levantar poeira para os olhos dos leitores? Afinal José Manuel Fernandes queria informar os leitores ou apenas formá-los em função das suas opções? Será que o PÚBLICO tem medo do contraditório? Sinceramente não tenho, ainda, uma opinião formada acerca da construção do TGV, pelo que estou aberto a toda a informação a favor ou contra. O PÚBLICO prestaria um bom serviço ao publicar toda a informação disponível. O argumento ridículo de que não tinha espaço para a publicação da resposta não faz qualquer sentido. Na mesma edição, são gastas oito páginas, com chamada a metade da 1ª página, com propostas utópicas para o Terreiro do Paço (...). Não estou contra esta iniciativa, mas remeter a discussão da linha de alta velocidade para uma mera ‘carta ao director’, como se de um assunto menor se tratasse, é não respeitar o direito à informação dos leitores. Mais grave, ainda, é a nota do director: criticar a RAVE por fazer um enquadramento da sua resposta e, portanto, não responder às suas 22 questões é, no mínimo, de uma petulância e um despudor que não vão bem com um jornal que se pretendia de referência”.

Respondeu José Manuel Fernandes à interpelação do provedor sobre este caso: “Se a RAVE fazia questão numa explicação mais detalhada podia ter feito o mesmo que nós fizemos: pegar no telefone e propor, por exemplo, a publicação em duas partes, ou na internet. Alguém teria falado comigo ou com alguém da direcção, como sucedeu dezenas de vezes no passado tendo-se chegado à melhor solução (e atenção que esse tipo de negociações até já envolveu textos de ex-Presidentes da República, por exemplo). A RAVE não disse mais nada e voltou a enviar a resposta por carta, que teve de ser passada para computador por uma secretária. Face a esta resposta à nossa sugestão oral, demos o assunto por encerrado e publicámos a carta mais curta”.

O provedor entende dever criticar a atitude do PÚBLICO. Evidentemente que a RAVE “fazia questão numa explicação mais detalhada”, se não não teria enviado a primeira carta. É sabido de que uma resposta, em regra, é mais longa do que a pergunta que a motiva. Se o provedor perguntar qual é a receita do bacalhau à Gomes de Sá, não espera obviamente que lhe respondam com o mesmo número de palavras com que se designa o prato. E quem pergunta de boa fé quer obter uma resposta. Logo, o jornal deveria não só congratular-se pela resposta da RAVE às 22 questões de José Manuel Fernandes como procurar maneira de a acomodar na sua edição em papel. Isto é, deveria ter uma atitude pró-activa, propondo à RAVE a solução que o director acha que competia à empresa.

Para mais, está-se perante uma das principais polémicas que hoje agitam a sociedade portuguesa, e sempre foi apanágio editorial do PÚBLICO dar o máximo de contributos aos debates cruciais para o país, não varrê-los para debaixo da carpete.

Argumentos como o PÚBLICO não ter pessoal para teclar as cartas da RAVE são de mau pagador e nem deviam ser invocados. Se não tem, que arranje (até arranjou). O provedor também passa ao computador as cartas de leitores que lhe chegam em papel (felizmente poucas), e não pede suplemento de honorários por isso. Aliás, no caso da RAVE, bastou-lhe pedir à empresa que enviasse por e-mail toda a longa correspondência antes recebida por carta, o que logo foi feito, pelo que a alegação de José Manuel Fernandes não possui qualquer razoabilidade e evidencia até alguma má vontade perante quem reclama.

Também não colhe invocar “os termos da lei” para rejeitar a publicação da primeira carta da RAVE, como fez o director na resposta à segunda. A questão não se colocava na circunstância, porque a RAVE não havia respondido ao abrigo do direito de resposta, e o provedor entende que em situações idênticas o que deve prevalecer não são os formalismos legais mas sim fornecer aos leitores esclarecimentos tão cabais quanto possível. Aliás, José Manuel Fernandes nem deveria ter comentado a forma como a RAVE geriu o seu “direito” aos 5 mil caracteres, já que a empresa é inteiramente livre de o fazer.

RAVE andou bem neste caso, o PÚBLICO não.

CAIXA:

A fasquia dos 20 por cento

"Pela primeira vez em Portugal, a 7 de Junho os partidos à esquerda do PS obtiveram juntos mais de 20 por cento dos votos” – assim iniciava São José Almeida a sua crónica semanal da passada sexta-feira, intitulada “Os nós da esquerda”. “O pior é que muitos comentadores, editorialistas e redactores de notícias têm escrito semelhante falsidade, como se não fosse essencial, quando se escreve uma coisa, verificar se ela é verdadeira perante os factos”, comenta o leitor João Carlos Lopes. “Quem se habituou à exigência de rigor do PÚBLICO não entende como os seus jornalistas não se põem a coberto de erros desta natureza. Acontece que nas eleições de 1975, os partidos à esquerda do PS obtiveram 20,59% dos votos. Nas legislativas de 1979, o seu peso eleitoral ascendeu a 23,5% (só a APU [coligação comunista] teve 18,8%). No ano seguinte, 1980, tiveram 21,2%., com a APU a fixar-se, sozinha, nos 16,8. Não vale a pena procurar mais casos. Somam-se, nestas contas, os votos de todos os pequenos partidos, os de extrema-esquerda. Mas são partidos. E São José Almeida fala de partidos. (...) Convinha que o PÚBLICO não deixasse de ser um jornal com memória, isto é, que legitimasse o que nele se escreve em argumentos sólidos de respeito pela verdade”.

Explica a jornalista: “O que o leitor diz é verdade e é rigoroso, mas o que eu digo também é verdade e rigoroso. Como é percebido por quem ler o texto, trata-se de partidos com expressão parlamentar. Eu não falo do MEP ou do MRPP e dos outros partidos que concorrem às eleições. E cito os valores percentuais em causa do PCP e do BE, o que torna claro do que estou a falar”.

O provedor lamenta desiludir São José Almeida, mas só um dos dois é rigoroso, e trata-se do leitor: em 1979, os votos da APU e da UDP (que elegeu um deputado) totalizaram 21%.

Publicada em 16 de Agosto de 2009

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Carta do administrador da RAVE Carlos Fernandes ao director do PÚBLICO, em 19 de Junho de 2009

Li com atenção o seu editorial intitulado “Lista de perguntas a que era bom dar resposta”, publicado no passado dia 17 de Junho. Nesse editorial, após formular seis questões sobre o projecto de Alta Velocidade em Portugal, afirma: “Poder-se-ia continuar indefinidamente, multiplicando as questões a que não responde a muita papelada distribuída pela RAVE e pelo ministério. Sendo assim, quem assina por baixo?”

Em primeiro lugar devo assinalar que as questões colocadas versam matérias já amplamente esclarecidas e debatidas em múltiplas ocasiões. Não obstante, com o objectivo do esclarecimento público em mente, solicito a divulgação integral da resposta da RAVE a cada uma das seis questões colocadas por V. Exa.

Aproveito para esclarecer que as informações que agora se transmitem constam todas da “muita papelada”, como o Senhor Director lhe chama, disponível no website e na documentação da RAVE, facilmente consultáveis por quem tenha interesse em aprofundar o conhecimento sobre o projecto, e para lhe lembrar que a RAVE, na sequência de um outro editorial assinado por si sobre o projecto de Alta Velocidade (AV), lhe endereçou um convite em 21 de Novembro de 2007 para uma sessão de trabalho com vista ao esclarecimento de questões técnicas ou outras que considerasse de interesse sobre o projecto português, convite esse que se mantém.

Primeira pergunta: a linha será mesmo de alta velocidade (350 km/h), como se anuncia, ou apenas de velocidade alta (menos de 300 km/h)? É que, no plano espanhol, esta linha surge como linha mista destinada a passageiros e mercadorias por falta de tráfego, e colocar mercadorias numa linha de alta velocidade encarece imenso o projecto.

Resposta:
· A linha Lisboa–Madrid, quer em Portugal quer em Espanha, está a ser projectada e construída para tráfego misto e de modo a viabilizar o tempo de percurso de 2h45m na ligação directa entre as duas capitais, acordado na Cimeira Ibérica da Figueira da Foz, realizada em Novembro de 2003;
· Para respeitar esse compromisso assumido entre os dois Governos, do lado português, atendendo à orografia e demais condicionantes presentes, a linha está concebida para velocidades de projecto até 200 km/h, entre Lisboa e a Moita, e de 350 km/h, entre Moita e a fronteira, o que assegura o cumprimento de um tempo de percurso de 45 minutos em território português;
· Espanha tem já em construção cerca de 76 km de linha de alta velocidade do Eixo Lisboa-Madrid. A linha em território espanhol está concebida para uma velocidade de projecto de 350 Km/h, assegurando o cumprimento do objectivo de tempo de percurso acordado.

Segunda pergunta: do lado espanhol a linha está a ser construída com três carris de forma a permitir a circulação de comboios de bitola ibérica e bitola europeia, mas o concurso português para a ligação Poceirão-Caia prevê três linhas, duas para a alta velocidade em bitola europeia e uma, dita convencional, entre Évora e Caia, em bitola ibérica. Alguém pode explicar estas diferentes opções entre Portugal e Espanha? Alguém pode garantir que a nossa "alta velocidade" não passa a "velocidade alta" de Badajoz até Madrid?

Resposta:
· Do lado espanhol não está a ser construída uma linha com três carris, mas sim uma linha dupla de alta velocidade, em bitola UIC, e outra linha simples, em bitola ibérica, tal como do lado português;
· A coerência e total compatibilidade das opções técnicas estão asseguradas, não só pelo acordo entre os dois países relativo aos principais requisitos técnicos, como pela elaboração conjunta, através do AVEP – agrupamento europeu de interesse económico constituído por Portugal e Espanha – dos estudos relativos aos troços transfronteiriços.

Terceira pergunta: ao colocar a linha a passar pelo Poceirão, o projecto português obriga ou não a que se faça um ramal para o novo aeroporto de Lisboa (NAL)? Faz sentido uma linha de passageiros passar por um centro logístico de mercadorias e não por um grande aeroporto? Como se fará a ligação ao aeroporto? Sai-se do comboio com as malas e vai-se num shuttle? Muda-se de comboio?

Resposta:
· A ligação ferroviária ao Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) é concretizada através de uma ligação dedicada, tipo by-pass, entre a linha principal do Eixo Lisboa-Madrid, na zona do Poceirão, e o terminal aeroportuário;
· A rede ferroviária prevista permitirá serviços directos (sem necessidade de mudança de comboio), do tipo “shuttle”, entre a estação do Oriente e o terminal aeroportuário, de elevada frequência e com um tempo de percurso na ordem dos 22 minutos;
· Será também possível estabelecer serviços de continuidade entre o Eixo Lisboa-Porto e o NAL. Quer isto dizer que será possível a criação de serviços directos entre Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria e Oeste até ao NAL, com paragem em Lisboa mas sem necessidade de mudança de comboio;
· Está também prevista a ligação da rede convencional ao NAL, o que permitirá estabelecer serviços suburbanos ao resto da rede da área metropolitana, como sejam às linhas de Sintra, de Cascais, da Azambuja, de Almada-Pinhal Novo ou de Setúbal;
· Os únicos serviços que não terão acesso directo ao aeroporto, obrigando à mudança de comboio na futura estação do Poceirão, são as ligações à Extremadura espanhola e ao Algarve, representando apenas cerca de dois por cento de toda a procura do Novo Aeroporto de Lisboa. Contudo, até esta necessidade de mudança de comboio desaparecerá após a construção da ligação para nascente do NAL ao Eixo Lisboa-Madrid, a qual ocorrerá assim que os níveis de procura o exigirem.

Quarta pergunta: uma vez que a RAVE e o Governo insistem que o TGV deve entrar em Lisboa pela margem norte e não pela margem sul, depois de passar pelo aeroporto, quanto tempo a mais gastarão os passageiros que vierem do Norte e centro do país a chegar ao NAL? E se a linha obrigar ao transvase de todos os passageiros que vierem do Sul e do Leste (incluindo de Badajoz, Mérida e Cáceres) estes não perderão demasiado tempo e não considerarão preferível ir apanhar o avião a Madrid? Que impactos poderão ter estas escolhas na rentabilidade do futuro aeroporto?

Resposta:
· Na solução em desenvolvimento, correspondente ao traçado pela margem direita do Tejo (entrada em Lisboa, de quem vem do Porto, por Norte), o tempo adicional de percurso nos trajectos de Norte (Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria e Oeste) para o NAL é equivalente ao tempo adicional de percurso que a solução pela margem esquerda do Tejo impõe aos trajectos de Norte para Lisboa. Ora, correspondendo a procura para o NAL a menos de cinco por cento da procura total, seria absurdo adoptar um traçado (pela margem esquerda) que, para beneficiar essa pequena franja de passageiros, prejudicasse, na mesma medida, mais de 95 por cento da procura;
· Na prática, o traçado pela margem esquerda colocaria Lisboa numa situação de fim de linha, inviabilizando a criação de serviços de continuidade (por exemplo, Aveiro-Coimbra-Leiria-Lisboa-Évora);
· A solução pela margem esquerda possui ainda maiores limitações de capacidade, por concentrar no mesmo troço (entre Lisboa e o Poceirão) todos os comboios de Lisboa para o Porto, de Lisboa para Madrid, de Lisboa para o Algarve e shuttles;
· Acresce que o traçado pela margem esquerda não apresenta vantagens em termos financeiros que compensem as desvantagens assinaladas, pelo contrário, quando contabilizados devidamente não só os custos de construção mas também os custos de manutenção e operação e as receitas, a equação financeira é desfavorável para esta opção;
· Quanto à ligação do NAL para Leste (Évora e Extremadura espanhola), está previsto o prolongamento da ligação ferroviária à linha principal de alta velocidade também nesse sentido quando a procura o justificar, o que permitirá estabelecer serviços ao NAL sem necessidade de mudança de comboio. Mas, enquanto essa ligação não estiver concretizada, o acesso ferroviário ao NAL a partir de Leste será assegurado através de um único transbordo na zona do Poceirão, o que garantirá sempre uma maior competitividade, em termos de distância, face ao aeroporto de Madrid.

Quinta pergunta: é ou não verdade que o projecto escolhido para a terceira travessia do Tejo podia ser mais barato, se a ponte fosse só ferroviária e o trânsito automóvel fosse desviado para um túnel que fechasse o anel da CRIL, ligando Algés à Ponte Vasco da Gama, em vez de descarregar mais automóveis na Segunda Circular, em Lisboa? E têm ou não razão os operadores portuários quando dizem que essa travessia vai limitar gravemente a possibilidade de utilizar o mar da Palha para as operações portuárias? Alguém fez contas ao que isso pode representar?

Resposta:
· A construção de uma ponte rodo-ferroviária acarreta, necessariamente, maiores custos do que uma ponte exclusivamente ferroviária. Mas importa referir que não existe em lado algum do mundo qualquer ponte de dimensão comparável que seja exclusivamente ferroviária – em todos os casos optou-se por associar à componente ferroviária a componente rodoviária;
· Com efeito, a associação do modo rodoviário à travessia ferroviária permite alcançar sinergias importantes, quer em termos de custo quer de impactes, que criam a oportunidade, não desperdiçável, para o estabelecimento de uma ligação manifestamente em falta na área metropolitana de Lisboa e assim corrigir uma grave assimetria regional hoje bem patente;
· É preciso também não esquecer que o modo rodoviário gera um volume de receitas significativo, que permite compensar uma parte substancial dos custos adicionais que introduz;
· Quanto à travessia Algés-Trafaria, trata-se de uma infra-estrutura que serve diferentes funções e populações, pelo que não pode ser encarada como alternativa em termos funcionais. Por outro lado, tem subjacente um modelo de desenvolvimento territorial bem distinto, que contraria frontalmente o consagrado no Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROT-AML);
· No que respeita aos impactos na navegabilidade e actividade portuária, as características da ponte foram estabelecidas em articulação com a Administração do Porto de Lisboa, tendo também sido realizados contactos com outras entidades interessadas. Nesse âmbito, procurou-se fugir às abordagens empíricas, optando-se por suportar as decisões em estudos rigorosos que se socorreram das ferramentas de análise mais avançadas e apropriadas, de que são exemplo o desenvolvimento de um modelo de hidrodinâmica estuarina e a utilização do potente simulador de navegação da Escola Náutica Infante D. Henrique. De todo esse extenso trabalho resultou a definição de características geométricas da ponte que asseguram uma convivência adequada com a actividade portuária e que, naturalmente, não inviabilizam a navegação para montante.

Sexta pergunta: na construção da linha do TGV qual é a percentagem de incorporação de materiais construídos em Portugal? Os carris têm de ser importados? E o material circulante? Uma só linha dá para criar uma indústria? Ou será que nos vamos endividar ao estrangeiro, sobretudo para comprar equipamentos a empresas estrangeiras? Onde está a nossa Siderurgia? E a Sorefame desaparecida? E teriam elas capacidade para estas encomendas?

Resposta:
· A esmagadora maioria do investimento na rede ferroviária de alta velocidade está associado a sectores económicos em que as empresas portuguesas têm capacidade e experiência reconhecidas. Isso mesmo foi concluído no estudo “Potencial de participação da indústria nacional no projecto de Alta Velocidade”, desenvolvido em Maio de 2005 pelo ISCTE;
· Com efeito, mais de 65 por cento do investimento corresponde a trabalhos de obra civil, relativamente aos quais o potencial de participação nacional é muito alto (superior a 95 por cento). Em termos globais, o potencial de participação nacional na implementação da rede ferroviária de alta velocidade poderá situar-se entre 80 e 85 por cento;
· Por outro lado, o projecto da rede AV reúne condições para impulsionar o sector ferroviário nacional e permitir às empresas portuguesas ganharem dimensão e competências para abraçarem novos desafios fora de Portugal.

As perguntas colocadas são substantivas e em número elevado, pelo que as respostas teriam necessariamente que ser devidamente fundamentadas e, por isso, um pouco extensas.

Dado que foi o Senhor Director que solicitou a resposta às perguntas que formulou no seu editorial, e tendo em vista o bom esclarecimento público, insistimos na publicação integral da nossa resposta.

Esperamos desta forma ter respondido às questões colocadas e mantemo-nos ao dispor para eventuais esclarecimentos adicionais que entenda pertinentes.

O Vogal do Conselho de Administração
Carlos Fernandes

Segunda carta do administrador da RAVE Carlos Fernandes ao director do PÚBLICO, em 26 de Junho de 2009

Na sequência da indicação do Vosso jornal, da passada sexta-feira, dia 26 de Junho, de que a publicação do esclarecimento da RAVE às questões colocadas estaria limitada a um máximo de 5 mil caracteres (incluindo espaços), e considerando a complexidade da matéria e a necessidade de repetição das perguntas para a percepção das respostas, não será possível proceder à respectiva síntese de forma adequada.

Assim, solicita-se a publicação da informação anexa, que inclui as respostas aos três primeiros grupos de perguntas, sendo informados os leitores do PÚBLICO de que o conteúdo integral do esclarecimento às questões colocadas pelo jornal pode ser lido no site da RAVE: www.rave.pt.

Alta Velocidade – Resposta da RAVE a uma Lista de Perguntas.

No editorial intitulado “Lista de perguntas a que era bom dar resposta”, publicado no passado dia 17 de Junho, após formular um conjunto de perguntas sobre o projecto de Alta Velocidade em Portugal, o Senhor Director do PÚBLICO termina dizendo: “Poder-se-ia continuar indefinidamente, multiplicando as questões a que não responde a muita papelada distribuída pela RAVE e pelo ministério. Sendo assim, quem assina por baixo?”

A RAVE respondeu a essas perguntas em carta enviada ao PÚBLICO em 19 de Junho passado, com pedido de publicação – sendo as perguntas substantivas e em número elevado (6 grupos de questões totalizando 22 perguntas), as respostas teriam necessariamente que ser devidamente fundamentadas e, por isso, um pouco extensas.

O Senhor Director do PÚBLICO entendeu que, para ser publicada, essa resposta não deveria exceder 5 mil caracteres.

Obviamente, se o que se pretende é, acima de tudo, contribuir para um bom esclarecimento público, não é possível responder de forma minimamente completa e clara a 22 perguntas sobre temas complexos nesse espaço de 5 mil caracteres.

Pelos vistos, não é esse o entendimento do Senhor Director do PÚBLICO, vendo-se assim a RAVE limitada no seu legítimo direito de resposta às perguntas colocadas no referido editorial.

Por esse motivo, a RAVE solicita a publicação das suas respostas aos três primeiros grupos de perguntas e informa os leitores do PÚBLICO que o conteúdo integral do seu esclarecimento pode ser lido no site da RAVE: www.rave.pt

Primeira pergunta: a linha será mesmo de alta velocidade (350 km/h), como se anuncia, ou apenas de velocidade alta (menos de 300 km/h)? É que, no plano espanhol, esta linha surge como linha mista destinada a passageiros e mercadorias por falta de tráfego, e colocar mercadorias numa linha de alta velocidade encarece imenso o projecto.

Resposta:
· A linha Lisboa–Madrid, quer em Portugal quer em Espanha, está a ser projectada e construída para tráfego misto e de modo a viabilizar o tempo de percurso de 2h45m na ligação directa entre as duas capitais, acordado na Cimeira Ibérica da Figueira da Foz, realizada em Novembro de 2003;
· Para respeitar esse compromisso assumido entre os dois Governos, do lado português, atendendo à orografia e demais condicionantes presentes, a linha está concebida para velocidades de projecto até 200 km/h, entre Lisboa e a Moita, e de 350 km/h, entre Moita e a fronteira, o que assegura o cumprimento de um tempo de percurso de 45 minutos em território português;
· Espanha tem já em construção cerca de 76 km de linha de alta velocidade do Eixo Lisboa-Madrid. A linha em território espanhol está concebida para uma velocidade de projecto de 350 Km/h, assegurando o cumprimento do objectivo de tempo de percurso acordado.

Segunda pergunta: do lado espanhol a linha está a ser construída com três carris de forma a permitir a circulação de comboios de bitola ibérica e bitola europeia, mas o concurso português para a ligação Poceirão-Caia prevê três linhas, duas para a alta velocidade em bitola europeia e uma, dita convencional, entre Évora e Caia, em bitola ibérica. Alguém pode explicar estas diferentes opções entre Portugal e Espanha? Alguém pode garantir que a nossa "alta velocidade" não passa a "velocidade alta" de Badajoz até Madrid?

Resposta:
· Do lado espanhol não está a ser construída uma linha com três carris, mas sim uma linha dupla de alta velocidade, em bitola UIC, e outra linha simples, em bitola ibérica, tal como do lado português;
· A coerência e total compatibilidade das opções técnicas estão asseguradas, não só pelo acordo entre os dois países relativo aos principais requisitos técnicos, como pela elaboração conjunta, através do AVEP – agrupamento europeu de interesse económico constituído por Portugal e Espanha – dos estudos relativos aos troços transfronteiriços.

Terceira pergunta: ao colocar a linha a passar pelo Poceirão, o projecto português obriga ou não a que se faça um ramal para o novo aeroporto de Lisboa (NAL)? Faz sentido uma linha de passageiros passar por um centro logístico de mercadorias e não por um grande aeroporto? Como se fará a ligação ao aeroporto? Sai-se do comboio com as malas e vai-se num shuttle? Muda-se de comboio?

Resposta:
· A ligação ferroviária ao Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) é concretizada através de uma ligação dedicada, tipo by-pass, entre a linha principal do Eixo Lisboa-Madrid, na zona do Poceirão, e o terminal aeroportuário;
· A rede ferroviária prevista permitirá serviços directos (sem necessidade de mudança de comboio), do tipo “shuttle”, entre a estação do Oriente e o terminal aeroportuário, de elevada frequência e com um tempo de percurso na ordem dos 22 minutos;
· Será também possível estabelecer serviços de continuidade entre o Eixo Lisboa-Porto e o NAL. Quer isto dizer que será possível a criação de serviços directos entre Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria e Oeste até ao NAL, com paragem em Lisboa mas sem necessidade de mudança de comboio;
· Está também prevista a ligação da rede convencional ao NAL, o que permitirá estabelecer serviços suburbanos ao resto da rede da área metropolitana, como sejam às linhas de Sintra, de Cascais, da Azambuja, de Almada-Pinhal Novo ou de Setúbal;
· Os únicos serviços que não terão acesso directo ao aeroporto, obrigando à mudança de comboio na futura estação do Poceirão, são as ligações à Extremadura espanhola e ao Algarve, representando apenas cerca de dois por cento de toda a procura do Novo Aeroporto de Lisboa. Contudo, até esta necessidade de mudança de comboio desaparecerá após a construção da ligação para nascente do NAL ao Eixo Lisboa-Madrid, a qual ocorrerá assim que os níveis de procura o exigirem.

A resposta às restantes perguntas pode ser lida no site da RAVE: www.rave.pt.

O Vogal do Conselho de Administração
Carlos Fernandes

Carta do administrador da RAVE Carlos Fernandes ao provedor, em 10 de Julho de 2009

Publicou o PÚBLICO no dia 17 de Junho um Editorial intitulado “Lista de perguntas a que era bom dar resposta”, assinado pelo director do jornal, José Manuel Fernandes, que continha um conjunto de questões sobre o projecto de Alta Velocidade em Portugal.

Nesse Editorial afirma-se, nomeadamente:

- “Há demasiadas perguntas sem resposta cabal e sustentada para que mesmo os defensores do TGV possam assinar por baixo o projecto que o Governo pôs a concurso”;

- “Poder-se-ia continuar indefinidamente, multiplicando as questões a que não responde a muita papelada distribuída pela RAVE e pelo ministério. Sendo assim, quem assina por baixo?”;

- “Por isso era bom que, ao menos, Mário Lino e a sua equipa pudessem responder às seguintes questões para esclarecer algumas das muitas dúvidas que o projecto do TGV levanta”.

Sendo a RAVE, entidade tutelada pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, responsável pelo lançamento do projecto de Alta Velocidade em Portugal, e com o objectivo do esclarecimento público em mente, solicitei, em carta enviada ao jornal a 19 de Junho, a divulgação integral da resposta da RAVE a cada uma das perguntas formuladas no dito Editorial, resposta que tinha cerca de 12.700 caracteres (incluindo espaços).

No dia 26 de Junho, a Direcção do jornal informou a RAVE que a publicação do esclarecimento estava limitada a um máximo de 5.000 caracteres (incluindo espaços).

Assim, a RAVE enviou a 29 de Junho uma nova resposta ao PÚBLICO, divulgada na edição de 4 de Julho, explicando, em carta anexa, que – devido à complexidade da matéria e à necessidade de repetição das perguntas (seis grupos de questões totalizando 22 perguntas, com cerca de 2.700 caracteres, incluindo espaços) para a percepção das respostas – não era possível proceder a uma síntese de forma adequada, pelo que solicitava a publicação das respostas “aos três primeiros grupos de perguntas, sendo informados os leitores do PÚBLICO de que o conteúdo integral do esclarecimento às questões colocadas pelo jornal pode ser lido no site da RAVE: www.rave.pt.”

No final da resposta da RAVE publicada a 4 de Julho, José Manuel Fernandes escreve em Nota da Direcção:

“Sugere-se nesta carta que o PÚBLICO teria limitado à RAVE o direito de esclarecer os nossos leitores. O PÚBLICO limitou-se a dizer que as dimensões da carta não permitiam que esta fosse publicada, na íntegra, na edição em papel, e deu como referência o tamanho do texto a que ela respondia, fazendo-o nos termos da lei. A RAVE preferiu ocupar quase um terço desse espaço a atacar a decisão do PÚBLICO em vez de responder a mais uma das 22 questões.”

A RAVE reafirma que, sendo as perguntas formuladas substantivas e totalizando 22 questões, as respostas teriam que ser devidamente fundamentadas, pelo que – tendo a RAVE por objectivo contribuir para o esclarecimento público – não era possível responder, de forma minimamente completa e clara, a 22 perguntas sobre temas complexos no espaço de 5.000 caracteres determinado pela Direcção do jornal.

Pelas razões expostas, a RAVE reafirma que se considera limitada no seu legítimo direito de resposta às perguntas colocadas no Editorial de 17 de Junho, assunto que coloca à consideração de V. Exa.

O Vogal do Conselho de Administração
Carlos Fernandes

Carta do leitor João Garcia

Como leitor fiel deste jornal, desde há muitos anos, não posso deixar passar o que considero mais uma machadada no direito à informação dos leitores do PÚBLICO. Refiro-me à "resposta da RAVE a uma lista de perguntas" publicada na rúbrica "Cartas ao Director". Afinal JMF queria respostas às suas perguntas ou apenas levantar poeira para os olhos dos leitores? Afinal JMF queria informar os leitores ou apenas formá-los em função das suas opções? Será que o PÚBLICO tem medo do contraditório? Sinceramente não tenho, ainda, uma opinião formada àcerca da construção do TGV, pelo que estou aberto a toda a informação a favor ou contra. O PÚBLICO prestaria um bom serviço ao publicar toda a informação disponível. O argumento ridículo de que não tinha espaço para a publicação da resposta não faz qualquer sentido. Neste mesmo jornal são gastas oito páginas, com chamada de metade da 1ª página, com propostas utópicas para o Terreiro do Paço algumas das quais poderão ter dado muito gozo aos seus autores, mas pouco contribuem para o debate acerca da renovação da Praça. Não estou contra esta iniciativa, mas remeter a discussão da linha de alta velocidade para uma mera "carta ao director", como se de um assunto menor se tratasse, é não respeitar o direito à informação dos leitores. Mais grave, ainda, é a N.D. (Nota do Director?). Criticar a RAVE por fazer um enquadramento da sua resposta e, portanto, não responder às suas 22 questões é, no mínimo, de uma petulância e um despudor que não vão bem com um jornal que se pretendia de referência.

João Garcia

Explicações do director do PÚBLICO

A carta inicial tinha quase 13 mil caracteres e, como não foi enviada por computador, parecia ter mais. Treze mil caracteres no Espaço Público é ingerível, pois corresponderia a pelo menos página e meia, e não há formato para tal. Para além disso a extensão do texto, em papel, tirar-lhe-ia toda a eficácia.

Habitualmente o que fazemos é sugerir que se reduza para o tamanho de um texto de opinião (que, com raras excepções, não deveriam ultrapassar os 5 mil caracteres).

Não houve qualquer carta nossa [à RAVE] porque o texto inicial não vinha ao abrigo do direito de resposta. Quando foi recebida [a priemira carta da RAVE] a Madalena [secretária da direcção do PÚBLICO] entrou em contacto com uma secretária da administração da RAVE que a passou a alguém que não sabe identificar pela função, mas que presumo ser do departamento de comunicação. Colocou oralmente o problema de um artigo com aquela dimensão, para além de chegar em papel e não por mail, o que coloca problemas de composição (não temos ninguém para essas funções), ser impossível de paginar no P1. Indicou-lhe a dimensão ideal do texto e ele ficou de dizer qualquer coisa. A resposta chegou na versão reduzida, boa parte da qual ocupada não a responder às questões mas a queixar-se de não ter sido publicada a versão integral.

Se a RAVE fazia questão numa explicação mais detalhada podia ter feito o mesmo que nós fizemos: pegar no telefone e propor, por exemplo, a publicação em duas partes, ou na Internet. Alguém teria falado comigo ou com alguém da direcção, como sucedeu dezenas de vezes no passado tendo-se chegado à melhor solução (e atenção que esse tipo de negociações até já envolveram textos de ex-Presidentes da República, por exemplo).

A RAVE não disse mais nada e voltou a enviar a resposta por carta, que teve de ser passada para computador por uma secretária.

Face a esta resposta à nossa sugestão oral, demos o assunto por encerrado e publicámos a carta mais curta, até porque no vai e vem já tinham passado umas duas semanas.

José Manuel Fernandes

Mensagem do provedor para o director

Presumo que a resposta é negativa, mas de qualquer modo sou obrigado a perguntar-te se antes de escreveres o editorial o PÚBLICO fez alguma das seis perguntas à RAVE.

Joaquim Vieira

Resposta do director

Especificamente para o Editorial não, mas temos dezenas de artigos do Carlos Cipriano em que os diferentes temas eram abordados.

As questões levantadas no Editorial resultam muito da leitura de
documentos e estudos da RAVE, da interpretação sobre a insuficiência
das respostas que tem dado em inúmeros debates públicos e do que
também publicámos.

Utilizar a fórmula das perguntas é uma técnica de retórica habitual
num texto de opinião que reflecte sobre a insuficiência do
esclarecimento público de opções políticas.

José Manuel Fernandes

Carta do leitor João Carlos Lopes

"Pela primeira vez em Portugal, a 7 de Junho os partidos à esquerda do PS obtiveram juntos mais de 20 por cento dos votos", escreve São José Almeida na edição de 14 de Agosto. O pior é que muitos comentadores, editorialistas e redactores de notícias têm escrito semelhante falsidade, como se não fosse essencial, quando se escreve uma coisa, verificar se ela é verdadeira perante os factos. Que isto apareça escrito e dito noutros órgãos de informação, não se estranha, mas quem se habituou à exigência de rigor do PÚBLICO não entende como os seus jornalistas não se põem a coberto de erros desta natureza. Acontece que nas eleições de 1975, os partidos à esquerda do PS obtiveram 20,59% dos votos. Nas legislativas de 1979, o seu peso eleitoral ascendeu a 23,5% (só a APU teve 18,8%). No ano seguinte, 1980, tiveram 21,2%, com a APU a fixar-se, sozinha, nos 16,8. Não vale a pena procurar mais casos. Somam-se, nestas contas, os votos de todos os pequenos partidos, os de extrema-esquerda. Mas são partidos. E São José Almeida fala de partidos. E politicamente isso não se pode pôr debaixo do tapete, atendendo até à grande quantidade de comentadores que hoje tratam o PCP e o BE como “partidos de extrema-esquerda”. Convinha, portanto, que o PÚBLICO colocasse as coisas no seu devido lugar, a bem da verdade e de um respeito mínimo pelos factos e pela História. Mas convinha mais que o PÚBLICO não deixasse de ser um jornal com memória, isto é, que legitimasse o que nele se escreve em argumentos sólidos de respeito pela verdade, por irrelevantes que eles possam parecer. E, nesta questão, parece-me que há muito de relevante, perante uma afirmação que tem tanto de categórica como de falsa.

João Carlos Lopes

Explicações de São José Almeida

O que o leitor diz é verdade e é rigoroso, mas o que eu digo também é verdade e rigoroso. Como é percebido por quem ler o texto, trata-se de partidos com expressão parlamentar. Eu não falo do MEP ou do MRPP e dos outros partidos que concorrem às eleições. E cito os valores percentuais em causa do PCP e do BE, o que torna claro do que estou a falar. Por outro lado, fica explicito no texto que falo da eventual quebra da tendência para o crescimento dos partidos do centro iniciada em 1987, fenómeno que, aliás, está estudado em Portugal por diversos especialistas em eleições e em sistemas políticos. Mais um esclarecimento: eu não classifico o PCP e o BE como extrema-esquerda nesse texto nem em nenhum outro que alguma vez tenha escrito, o que eu digo no texto é que há um deslizamento do PS para a direita.

São José Almeida

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